Direito à vida?

A interrupção voluntária da gravidez é um tema delicado? Sem dúvida.
Há que estar informado? Pois claro que sim.
Há que ter opinião e votar? Obviamente.

Mas... Confesso. Já me cansa o esgrimir dos mesmos argumentos repetidos dos dois lados do que é, afinal, a mesma moeda.
Argumentos fatiados, servidos com salada e com uma grande dose de exagero em muitas circunstâncias.

A verdade é que dúvido que alguem consiga estar 100% de acordo com uma das posições.
Afinal há argumentos válidos dos dois lados:

Por um lado temos argumentos como:
- a ética da vida
- a nobreza de quem quer ver em cada pessoa um ser responsável pelos seus actos
- a ideia de que abortar é pensar na mulher de forma unilateral, não pensando na criança
- a educação sexual como forma de contracepção em vez do aborto vulgarizado

Por outro temos que:
- o aborto é legal na maior parte dos países europeus (serão os outros menos inteligentes/éticos que nós?)
- segurança e acessibilidade é uma questão de saúde pública
- a punição criminal é humilhante e não chega a ser inibidor
- quando não há condições (económicas, psicológicas, sociais...) ter um filho indesejado só traz sofrimento para ambos

Podia rebater ponto por ponto, detalhe a detalhe, indo buscar a ciência, a lei e todas as partes envolvidas, e usar de acusações acutilantes para fazer valer a minha posição.
Mas isso seria desrespeitar a opinião de quem não tem a mesma forma de ver as coisas, o que é tão válido quanto a minha ou outra opinião.
Por isso exponho o meu ponto de vista da forma mais neutra e factual possível.

Para mim, é simplesmente uma questão de consciência de cada um.

A palavra consciência é facilmente confundida com moral e com culpa, numa atitude conservadora e contra a mudança.
Mas não é de moralismos que se trata aqui. Ser consciente é ser pragmático.
E o que é o pragmatismo?
- a verdade de uma ideia reside na sua utilidade, se define pelo seu êxito.
- a função essencial da inteligência é, não de nos fazer conhecer as coisas, mas de permitir a nossa acção sobre elas.
(in Dicionário da Língua Portuguesa)

Na prática, sabemos que não vai deixar de haver aborto. O aumento do número de abortos é uma falsa questão.
Nenhuma mulher no seu perfeito juizo troca a protecção sexual pela sujeição ao sofrimento fisico e emocional.

Em pleno Século XXI, temos (no mínimo) obrigação de deixar as formas de tortura e inquisição de lado e usar a tolerância e apoio como pontos de partida.

Para mim votar NÃO, é o mesmo que dizer que quero que permaneça tudo como está.
Não vale manipular os factos dizendo que é uma atitude de despenalização.
Ou então acaba-se com este referendo e reformula-se a pergunta (mais valia).

E votar SIM é ser pragmático e não é o mesmo que dizer que quero a banalização do aborto.
Das duas opções que são dadas, o SIM parece-me mais construtivo.

Em vez de se investir tempo em encontrar culpados, deve-se investir tempo no acompanhamento e aconselhamento das mulheres a quem têm que ser dadas opções, sem moralismos de fundamento algum.
E deixá-las decidir, conscientemente e sem julgamentos, é acreditar verdadeiramente no direito à vida.