Lugares


Já algum dia experimentaram ir visitar hoteis? Não. Nada disso. Não como hóspedes, mas como simples curiosos. Chegar à recepção e dizer que se quer ver o espaço, um quarto, as salas comuns, a sala de refeições, as salas de reuniões... e ser conduzido por pessoas que nos contam pequenos segredos do hotel, ou simples pormenores, que nos respondem às nossas perguntas indiscretas: de quem o ocupa, de coisas sórdidas, de rotatividade de clientes e por aí a fora.
Eu já o fiz. Numa dada altura era obrigada a "meter o bedelho" onde não era chamada e até se tornou divertido (quando estava a tirar uma Pós-Graduação em Gestão Hoteleira e fazia parte dos trabalhos de casa fazer entrevistas, estudos e afins). Mas ontem fui simplesmente procurar um espaço para uma Conferência.
Chovia a cântaros, e dei por mim a praguejar contra o marketing e as fotos trabalhadas que colocam na internet para depois chegarmos ao local e reparamos que aquele candelabro XPTO até existe... mas é um detalhe insignificante num quarto a cair de velho... "nouvelle arte deco" dizem eles, para justificar o preço pedido pela noite dormida entre paredes a cheirar a bolor.
Fui aos Hoteis mais clean e modernos, primam pelo aprumo mas sente-se uma certa frieza nas paredes distantes. Há ali histórias para contar, de noites mal dormidas, de passagens rápidas, de mini-bares "assaltados", de reuniões de corpo presente...
Mas foi num desses agora designados de "hotel de charme", naqueles mais antigos e escondidos, de corredores estreitos, camas de dossel, padrões de cortinados e colchas demodé, soalhos rangentes e portas labirinticas, onde um pouco do conforto se troca pelo intimismo, que me surpreendi ao me ser revelado pela minha pseudo-anfitriã que tinha sido precisamente ali que Eça de Queiroz teria escrito os Maias. Parei estupefacta. Seria verdade?
Bem pela biobliografia ele esteve em Lisboa e a revelação da sua obra-prima só se deu depois de 1888... mas e a famosa casa de Tormes?
Visitei o quarto, o jardim, a varanda com vista para o Tejo... sendo verdade ou a mais pura das intrugices (o mais provável) tentei imaginá-lo naquele lugar, o que o inspirava, os seus gestos, as ideias que se lhe assomavam... De repente tudo ficou como que encantado. Devo ter ficado de tal modo fascinada que a moça que me acompanhava ficou com aquele ar de "Mas o que deu a esta?"
No final da experiência fui para casa com aquela sensação preenchida de ter visitado um museu e não me pareceu de todo uma segunda-feira! : )