Calvin e Mia


Dizem que os animais pressentem as emoções dos seus donos.
Acredito nisso.

Entrei em casa ainda num misto de irritação e de qualquer coisa mais que não sei definir mas que me dava vontade de bater em alguem ou mesmo em mim própria.
Há dias assim. E ontem foi um desses dias em que as notícias que ia recebendo no trabalho me faziam acreditar que havia um qualquer plano maquiavélico e infernal, ora contra mim pessoalmente, ora contra a àrea de negócio em que me insiro.
Mas adiante.

A verdade é que o Calvin e a Mia (na foto) desataram numa correria estonteante pela casa, mordendo-se, escondendo-se, apanhando-se, dando patadas um no outro e no meio de uma bulha grunhenta pararam na posição ninja em que estavam (numa perfeita imagem congelada do movimento de patas no ar, como se eu tivesse dito “olha a foto!” e os tivesse surpreendido de olhos arregalados) olharam para mim como que a dizer “então não te ris destas nossas acrobacias?”. Soltei uma gargalhada e com ela um pedaço de tensão.

Eles desenvencilharam-se então um do outro e vieram calmamente sentar-se ao meu lado, ladeando-me e dando-me ternurentas marradinhas com a cabeça. Conhecem-me bem estes meus bichos traquinas, sabem bem como me fazer acalmar e ficar mais bem disposta. O sucalco da testa franzida depressa se dissipou.

E é nestes momentos que reparamos com atenção nas pequenas coisas que tomamos como comuns e até rotineiras, como o facto daqueles dois bolas de pêlo estarem ali todos os dias à porta à minha espera para me receberem (ou se calhar é para verem se venho carregada de sacos de compras com comida e só percebem mesmo o “bla bla bla Wiskas saquetas”).

Aqueles dois que salvei de uma muito provável morte e que passam o dia a dormitar e a espreguiçar-se. Rica vida.
Comem; brincam com tudo que apanham (e estou em crer que foram eles que inventaram o futebol); espreitam da janela as pessoas na rua com atentas orelhas espetadas; metem-se onde não são chamados (foi à conta disso que a Mia voou da janela e acabou com uma pata partida); cheiram tudo (são loucos por aromas de perfumes e cosméticos); têm como hobbie morder sapatos e coisas que levo do escritório (!!); chamam com miados e arranhadelas na porta se ao fim de semana me sentem acordada no quarto e ainda não lhes fui dizer bom dia; arranham o sofá por puro prazer de me ver na minha faceta soviética; adoram o som da àgua a correr; metem-se com as gotas que escorrem na cortina do duche tentando apanhá-las; dão pequenos gemidos quando estão excitados com a caça a uma simples mosca; fazem birra quando demoro um pouco mais a trocar a areia; fogem a 7 patas dos veterinários, banhos e penteadelas; não gostam de ficar muito tempo sózinhos; odeiam viagens de carro; abominam o aspirador; desconfiam da esfregona que deixa o chão escorregadio e os faz dar grandes derrapagens e correr vários segundos no mesmo sitio sem sair do lugar (tal e qual como nos desenhos animados); acham que são mestres no jogo das escondidas mas esquecem-se da cauda de fora; são territoriais, observadores mas sociais e nunca os vi assanhados; ele é tigrado, persistente, brincalhão, carente e fugidio, um perfeito gato de rua adaptado ao apartamento; ela não ronrona, é mais segura mas mais ciumenta, é meiga mas fica amuada e vira-me as costas se lhe ralho, nunca toca em comida de gente nem no lixo. Ele é um rufia, ela uma perfeita dondoca.

Inicialmente fiquei com eles apenas temporariamente (pois sou alérgica ao pêlo... mas se não podes vencê-los junta-te a eles!) ... a verdade é que os adoro e à sua forma de acharem que são o centro de tudo, como bem ilustra o que dizia uma amiga minha:
“Quando damos de comer a um cão ele acha que somos Deus,
Quando damos de comer a um gato ele acha que é um Deus.”

Para se juntar à festa tenho ainda uma tartaruga (a Clarinha) e 7 peixes vermelhos (o shake that ass, o yahoo, o barbatanas, o barriga, o little, o red, e o malhado) que à primeira vista podem parecer todos iguais mas são bem diferentes. Mas sobre estes todos falarei outro dia.